Aniversário do irmão Raul – por Arthur Eduardo

Irmãos Arthur e Raul em 1997, Parajuru/Ceará

Dia 14 de novembro Raul Aragão, jovem atropelado em outubro, completaria 24 anos. Por ocasião de seu aniversário, seu irmão mais velho, Arthur Eduardo, escreveu o emocionante texto que compartilhamos a seguir:

Ontem teria sido aniversário do meu irmão Raul.
Nunca fui bom com datas de aniversário. Todo ano ligava pra ele no dia de hoje. Ele me sempre me lembrava, sem me censurar, que o dia certo era 14 de novembro. Ontem. Eu retrucava à guisa de desculpa esfarrapada, meio irônica meio envergonhada, que assim era até melhor pois assim eu tinha exclusividade e podia conversar longamente com ele. Do outro lado da linha ele gargalhava com franqueza.
Todo ano esse ritual, que minha má memória reforçava, se repetia. Hoje seria o dia que eu ouviria sua risada gostosa e cheia de vida.
Assim era meu irmão.
Ou pelo menos a parte dele que eu conhecia. Queria deixar minhas palavras, falar sobre Raul, já faz um tempo, um tempo longuíssimo. Mas eu queria esperar, queria entender quem era meu irmão, as partes que eu não conhecia. Remontá-lo peça por peça como quem resolve um enigma, desses que solucionam essas grandes questões da humanidade: O que é Justiça? Qual o segredo para a Felicidade? Qual o Sentido da Vida?
Nesses dias ouvi relatos, pessoas que conheceram Raul às vezes por um dia ou sequer por poucas horas. “Raul era um cara astral!”, “Raul era muito gente boa, fez uma playlist muito massa pra mim!”, Aquela vez, Raul fez isso… Aquela vez, Raul fez aquilo outro… Raul era altruísta: dava aula voluntárias de reforço para alunos com dificuldade e sem condições. Raul era engajado: participava de duas ONGs. Raul era inteligente: montou SOZINHO o site da CPI da Previdência. Raul era doce e gentil. Raul era alegre. Raul era prestativo. Raul era um guerreiro da alegria: ensinava sorrindo as crianças de todas as idades a pedalar, que é a forma mais bonita de se locomover. Raul as defendia. Raul era generoso. Raul era sábio: quando duas pessoas brigavam, ia conversar com as duas, atento, pacientemente escutando as razões dos dois lados, concordando com ambas, mas secretamente planejando e operando para reconciliá-las.
Raul era isso: um filantropo, um amigo da humanidade. RAUL OLHAVA AS PESSOAS!
Seu espírito era feito do diamante mais puro, belo e forte. Sua carne que era frágil (isso é de todos nós), não era de aço frio, suas entranhas não eram engrenagem de ferro bruto. Nas suas veias corria sangue. Seu coração não era uma máquina feroz e voraz.
Eu tinha planos de acompanhar Raul numa pedalada pela Europa (ele queria fazer seu mestrado em Amsterdã, capital mundial dos ciclistas). Ele nunca soube dos meus planos. Minha oportunidade de contá-los à Raul me foi arrancada. Assim como Raul foi arrancado de todos nós. Abruptamente.
Não quero ser egoísta na minha dor e perda, não fui apenas eu que fiquei órfão de Raul. A dor não é só minha, Raul tinha outros irmãos. No dia que foi colhido, Raul fez amizade com um desconhecido! Embora eu possa lamentar a dor de tudo o que poderia ter sido e não será jamais: as nossas conversas, o meu orgulho contínuo e crescente por ele, as aventuras que poderíamos ter tido, os sobrinhos maravilhosos que certamente ele teria me dado; não posso deixar de pensar nos outros (é o que Raul faria!). Ao perder meu irmão, o mundo perdeu sua alegria contagiante, sua generosidade, sua sabedoria, sua força, sua beleza, sua amizade. Minha solidariedade e sentimentos aos meu co-irmãos de sangue e espírito. E mesmo àqueles que o perderam sem saber.
Raul era… Raul foi…. Raul seria…. Está errado!
Quero seguir os passos do meu irmão! Faço aqui um convite a todos os meus co-irmãos: vamos seguir o exemplo de Raul: sua luta, sua causa, sua alegria, sua ternura, sua coragem, sua sede de justiça. Como Raul faria!
RAUL VIVE! RAUL PRESENTE!

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